A minha educação nasceu das poupanças

A minha educação nasceu das poupanças
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Fotografias de Maria João Gala e Rodrigo Cabrita
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E

ntre propinas, casa e alimentação, frequentar o ensino superior pode custar milhares de euros por ano. Como suportar estas despesas? Para muitos jovens, são as poupanças da família que servem de passaporte aos sonhos do futuro.

Com o verão a terminar, milhares de jovens em Portugal preparam-se para iniciar estudos no ensino superior. Resultados divulgados, matrículas feitas, começa aquela que é, talvez, a mais importante etapa nos alicerces do seu futuro profissional: a universidade ou o politécnico. As mudanças em relação ao ensino secundário são vastas e, para muitos, o curso superior será, simultaneamente, uma despedida da casa dos pais.

A par do entusiasmo (e algum nervosismo) entre os estudantes, pairam custos acrescidos sobre as famílias. Propinas, habitação, alimentação, transportes e livros são parcelas de uma nova “fatura” no orçamento familiar. Uma despesa adicional que, face ao atual contexto, pode sair demasiado cara, mesmo com bolsas de estudo. Como amenizar este esforço sem pôr em causa os sonhos dos filhos? A resposta está, muitas vezes, na poupança ao longo dos anos, precavendo o futuro.

“Grão a grão, enche a galinha o papo, como se costuma dizer. Mesmo o que pode parecer pouco dinheiro, ao fim de uns meses, de uns anos, pode ser uma ajuda importante”, lembra Ana Cristina Nunes, de Oliveira de Azeméis, a respeito da conta-poupança que manteve para a sua filha, Sílvia Lemos, desde que ela nasceu. Hoje com 34 anos, Sílvia é consultora em desenvolvimento rural, com uma licenciatura e mestrado em Engenharia Agropecuária pela Escola Superior Agrária de Coimbra. E é a primeira a reconhecer que as poupanças feitas regularmente pela mãe e pela avó na sua conta “fizeram toda a diferença” na sua vida.

Na conta-poupança de Sílvia, Ana Cristina depositava regularmente o abono de família pago pela Segurança Social, de cerca de 25 euros, e demais valores em dinheiro oferecidos à filha por ocasião dos aniversários e outros eventos. “Aquele era o dinheiro destinado ao futuro da Sílvia, depois de colocado na conta. Para nós era como se o dinheiro não existisse, ninguém podia mexer nele”, recorda. Para uma maior rentabilidade, a mãe e a avó de Sílvia combinaram a conta-poupança com as então denominadas “promissórias” (depósitos a prazo sem mobilização antecipada).

“A vida dá muitas voltas e nunca se sabe a importância que as poupanças vão ter, mesmo que pareça um valor pequeno todos os meses”, realça Ana Cristina. No caso desta família, a prudência de mãe e da avó em abrirem uma poupança para financiar os estudos de Sílvia revelaram-se essenciais perante os imprevistos. É que, na altura em que Sílvia frequentava a licenciatura em Coimbra, deslocada da habitação familiar e a pagar um quarto numa casa partilhada, entre 2007 e 2011, o pai sofreu um enfarte do miocárdio. Durante a recuperação, a família ficou privada de rendimentos. “O dinheiro das poupanças, feitas ao longo de dezoito anos, foram bastante importantes para eu conseguir manter-me na universidade e não ter de parar os estudos”, destaca Sílvia.

Sem o dinheiro que a mãe e avó pouparam durante 18 anos, provavelmente Sílvia Lemos não se teria licenciado em Engenharia Agropecuária, em Coimbra (Foto: Maria João Gala)

Poupar automaticamente para o futuro

E se fosse possível poupar regularmente para os seus filhos com o mínimo de esforço? Esta é base da Poupança Complementar Jovem, do Montepio Associação Mutualista, que simplifica os bons hábitos de poupança transmitidos de pais para filhos: pôr regularmente dinheiro de parte e aproveitá-lo para rentabilizar uma poupança que ajude nas futuras despesas com o ensino superior – e não só.

Com um rendimento (TANB) de 1,5% ao ano, a Poupança Complementar Jovem pode ser reforçada com entregas automáticas regulares ou livres. Uma poupança com rendimentos anuais e mais simples de concretizar, para hoje e para o amanhã.

Qual o custo de frequentar o ensino superior?

Uma década depois de Sílvia Lemos ter terminado os estudos, os custos de frequentar a universidade enquanto estudante deslocado são bastante diferentes. Sobretudo devido à escalada dos preços da habitação, que desequilibra ainda mais a balança do orçamento familiar.

No total, quanto custa hoje frequentar o ensino superior em Portugal? A soma diz respeito, essencialmente, a três parcelas fundamentais: propinas, habitação e alimentação.

Propinas

O Orçamento do Estado de 2023 fixou que, para o ano letivo de 2023-2024, o valor máximo no ensino superior público se manteria igual ao do ano letivo anterior:
697 euros por ano
(2 901 para três anos de licenciatura), refletindo uma redução de 20% ao teto máximo de 871 euros que se encontrava em vigor desde 2019.

No ensino privado, as contas não são tão lineares, já que tudo depende da instituição e do curso em causa. Por exemplo, na Faculdade de Ciências Humanas da Universidade Católica, a propina da licenciatura de Comunicação, Marketing e Relações Públicas está fixada em 495 euros por mês, atingindo um total de 4 950 euros no primeiro ano (10 mensalidades por ano), a que se somam 415 euros de matrícula e 155 euros de taxas de candidatura. Na mesma universidade, o mestrado integrado (licenciatura + mestrado) em Medicina prevê uma propina mensal de 1 795 euros (17 950 euros por ano), mais 1 620 euros por matrícula e 380 euros em taxas de candidatura. Todos estes valores reportam-se ao ano letivo de 2023-2024.

Olhando para outra instituição privada, uma licenciatura em Gestão Aeronáutica na Universidade Lusófona, por exemplo, tem uma propina média mensal de 398 euros. A inscrição está balizada em 335 euros e a matrícula custa 265 euros.

As diferentes instituições, públicas ou privadas, permitem o pagamento em prestações.

Habitação

Na plataforma interativa do Observatório do Alojamento Estudantil, consultada em julho de 2023, verifica-se que Lisboa é a cidade portuguesa mais cara para os estudantes. Um quarto custa, em média, 450 euros, com o valor mínimo de 250 euros e máximo de 625 euros. No Porto, o preço médio por quarto chega aos 420 euros, numa escala que vai de 219 euros a 672 euros. Em Vila Real encontram-se os valores mais baixos, com o quarto a custar uma média de 200 euros, sendo o valor mais baixo de 117 euros e o mais elevado de 291 euros.

Os preços médios mensais de um quarto nas residências para estudantes da Montepio U Live são mais reduzidos: 400 euros em Lisboa e no Porto, 30 euros em Braga e 200 euros em Évora (com 10% de desconto para associados Montepio). E há outra vantagem: ao contrário do que acontece muitas vezes no mercado livre do arrendamento, na Montepio U Live não há atualizações inesperadas.

Dependendo da localização do quarto (ou da habitação familiar, no caso de estudantes não deslocados), há também a considerar o preço dos transportes até à instituição de ensino.

Alimentação

O custo do cabaz de bens essenciais (63 produtos), monitorizado pela Deco, ronda os 216,50 euros (semana de 29 de junho 2023). Há que ter ainda em conta que as cantinas das universidades disponibilizam refeições sociais (almoço e jantar) aos alunos. Na Cantina Velha da Universidade de Lisboa, por exemplo, a refeição social custa 2,80 euros.

Assim, imaginemos o cenário de um estudante que se desloca para a capital com o objetivo de iniciar uma licenciatura na Universidade de Lisboa. O custo mensal (sem contabilizar bolsas de estudos ou outros atenuantes) pode rondar os 830 euros, incluindo propinas (prestação da propina máxima), quarto (valor médio em Lisboa), alimentação, passe (já com desconto sub23), despesas com livros e materiais. A partir dessa base, e ao longo de três anos de licenciatura, o valor total estará acima de 27 mil euros, já atenuando algumas despesas nos meses de verão.

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Suportar os custos: das poupanças ao trabalho

Poupar regularmente pode apoiar os pais e educadores a enfrentarem estas despesas. Para aliviar o esforço no orçamento familiar, o ideal é criar e reforçar mensalmente um plano de poupança, desde o nascimento da criança até à entrada no ensino superior (18 anos). Para conseguir poupar 27 mil euros ao fim desses 18 anos, por exemplo, com uma poupança inicial de 200 euros e uma TANB de 1,5% – como é o caso da Poupança Complementar Jovem, do Montepio Associação Mutualista –, precisa de um reforço mensal constante de 107,77 euros (de acordo com o Simulador da Poupança do portal Todos Contam).

Além disso, alguns estudantes recorrem a trabalhos complementares para aumentarem o rendimento disponível. Em Portugal, cerca de 10% dos jovens são trabalhadores-estudantes, segundo dados da Eurostat referentes a 2021 e divulgados em 2022. É, ainda assim, uma percentagem muito abaixo da média europeia, em que quase um quarto dos jovens (23%) opta por estudar e trabalhar.

“Embora haja essa necessidade, em Portugal não vemos a prática de estudar e trabalhar que, no norte da Europa, é quase transversal”, salienta André Relvas. O estudante do 5º ano de Medicina na Universidade do Porto faz parte do grupo de universitários que lançou uma petição em defesa dos direitos dos trabalhadores-estudantes. Em causa, refere a petição, estão as incompatibilidades entre ter um trabalho pontual, flexível ou em part-time como atividade independente (recibos verdes) e manter certos benefícios. Ao abrir atividade independente para um trabalho pontual, um estudante pode perder o direito à bolsa social, à elegibilidade para um estágio do IEFP, ao enquadramento na ADSE (no caso de beneficiários familiares) e à isenção de contribuição para a Segurança Social.

A petição visa expor ao país estas dificuldades dos estudantes e lutar pela mudança. A ação também está ligada a outra iniciativa destes estudantes: a plataforma Unilinkr, que faz a ligação entre universitários que procuram trabalhos pontuais e empregadores que têm essa oferta. Foi precisamente ao desenvolverem esta plataforma que André e os colegas se depararam com “todos os problemas que existiam a nível de legislação”. Daí à petição foi um passo. A recolha de assinaturas está a decorrer e André acredita que, sem os obstáculos assinalados, haverá caminho para uma maior cultura de trabalhadores-estudantes. Mesmo para quem tem as despesas do ensino superior asseguradas pela família, um trabalho pontual pode ser sempre um rendimento adicional e “uma forma de suportar alguns custos, nomeadamente os relacionados com a vida académica”, conclui o estudante de Medicina.

Estudar além-fronteiras

Se frequentar o ensino superior é uma despesa que abala o orçamento mensal das famílias, mesmo só tendo em conta a realidade nacional, o que acontece se a opção for estudar no estrangeiro? Neste caso, as despesas aumentam, assim como a necessidade de uma maior almofada financeira.

Associa-se, frequentemente, os estudos internacionais a áreas muito específicas de ensino – como as escolas internacionais para atores, onde as propinas podem custar, por ano, 26 500 euros (é o caso da London Academy of Music and Dramatic Arts) – ou a níveis de estudo mais avançados. Um MBA na francesa INSEAD Business School tem um custo de 97 mil euros, por exemplo, um valor muito superior aos 34 500 euros associados ao programa Lisbon MBA, promovido pela Universidade Católica e pela NOVA SBE.

Contudo, a aventura internacional pode começar logo no primeiro nível do ensino superior, como aconteceu com Carolina Martinez que, com 17 anos, se mudou de Portugal para Inglaterra, para frequentar o curso de Game Design no Kingston College. Atualmente com 21 anos, Carolina já concluiu o curso de dois anos (qualificação Btec) e voltou para Portugal. Quando faz as contas, aponta que as despesas com os seus estudos internacionais tenham ultrapassado os 20 mil euros, sem incluir propinas, já que beneficiou de uma isenção por ser menor de idade no início do plano de estudos.

“Tudo foi suportado pelas poupanças dos meus pais, que estão a poupar praticamente desde que se conheceram”, adianta Carolina. Em Kingston, subúrbio de Londres, a jovem vivia sozinha num pequeno estúdio para estudantes, por cerca de 800 libras por mês (cerca de 930 euros). Ficava perto da instituição de ensino e poupava, assim, em transportes. Carolina estima que, além dos custos com a habitação e a alimentação, as despesas rondavam as 300-400 libras por mês (entre 350 e 465 euros), dependendo sempre de gastos pontuais.

Mas porquê estudar no estrangeiro? “Conhecia pessoas a estudar em Inglaterra e sabia que o ensino lá se aproximava muito mais daquilo que quero para mim: um ensino mais prático, onde possa aprender realmente a fazer as coisas, que é algo que não encontro na oferta de ensino em Portugal.” Os últimos meses do curso foram terminados em Portugal, remotamente, num regresso por motivos pessoais.

Atualmente, Carolina não trabalha na área da sua formação mas continua à procura, apesar das dificuldades. É “extremamente difícil fazê-lo em Portugal, onde a área dos jogos quase não existe”, explica. Voltar a rumar além-fronteiras é uma possibilidade que tem ponderado, até pela experiência que já teve. Foi um primeiro passo internacional que considera que valeu a pena, apesar de todos os gastos adicionais. “Aprendi muito e preparou-me para o futuro, para o que vem daqui para a frente. Cresci muito com esta experiência.”

Carolina Martinez foi estudar para Inglaterra aos 17 anos. Apesar da isenção de propinas, terá gasto 20 mil euros em dois anos (foto: Rodrigo Cabrita)

Poupar: uma tradição de geração em geração

O dinheiro não traz felicidade, mas pode ser uma ajuda num futuro melhor para a próxima geração, de pais para filhos. Um ciclo de poupança, que apoia a educação e que, simultaneamente, educa.

O caso de Ana Cristina e da filha Sílvia é disso exemplo. Ana Cristina herdou o espírito de poupança da sua mãe. Beneficiária de uma conta-poupança desde que era bebé, fez questão de criar um plano de poupança semelhante para Sílvia, focado na educação e para “preparar o dia de amanhã”. Hoje, já com a filha criada, é com orgulho que conta que Sílvia herdou esta gestão das finanças pessoais. “A minha avó passou à minha mãe, a minha mãe passou-me a mim, eu passei à Sílvia. Aprendi a gerir assim o dinheiro, a poupar, e transmiti isso à minha filha”, conta Ana Cristina.

O ciclo de poupança é também visível na família de Vera, de 42 anos. Com dois filhos menores de idade, Vera mantém duas contas-poupança para que eles possam seguir os estudos no ensino superior quando chegar o momento. Todos os meses, desde que nasceram, transfere o dinheiro do abono de família para a conta de cada um dos filhos, arredondando o valor para cima. “O que recebem de abono não chega a 30 euros [por filho], eu arredondo para 50 euros e passo para a conta deles. No final do ano, são 1 200 euros. Fica tudo guardado, para o futuro.”

Este hábito de poupança de Vera foi herdado do pai que, oriundo de uma família de sete irmãos, “sempre teve o sonho de ir para a universidade e nunca conseguiu”. Fez, por isso, questão de proporcionar aos quatro filhos essa oportunidade – e os planos de poupança foram estratégias essenciais para consegui-lo. Vera e os seus três irmãos tiveram contas-poupança desde que nasceram. Como o abono era pago num cheque único, os depósitos acabavam por ser alternados entre as contas: no primeiro mês para a conta da filha mais velha, no segundo mês para a conta do segundo filho, e assim sucessivamente. A prudência foi bem recompensada, pois todos os filhos concluíram o ensino superior. A condição, para que tudo fosse possível, era prosseguirem os estudos no ensino superior no Algarve, onde moravam, para não aumentarem despesas.

A atitude do pai serve de inspiração diária para Vera, que defende a importância de um esforço regular de poupança para os filhos. “É dinheiro que fica de parte e no qual não se mexe, mesmo nos meses mais difíceis. E, na verdade, não é esse valor que, no próprio mês, vai fazer a diferença. Mais vale guardar para o futuro das crianças.” Ainda assim, não deixa de pensar – e de se preocupar – com esse futuro cada vez mais próximo, tendo em conta o aumento do custo de vida.

O amanhã é incerto, mas o abono volta a ser pago este mês pela Segurança Social e, pelos filhos, Vera continua a colocá-lo de lado e a poupar. Até porque, quanto mais cedo se começa a poupar, mais se tem guardado para apoiar os filhos no próximo voo, qualquer que seja o destino.

Quanto vai custar a educação no futuro?

Se, atualmente, estudar em Lisboa no ensino superior público pode rondar os 9 000 euros por ano, quanto custará a educação superior no futuro? Em 2030, este valor poderá subir cerca de 1 600 euros, traçando um cenário simples com base em 2% de inflação média anual (em linha com os objetivos do Banco Central Europeu). O que significa que, em três anos de licenciatura, se pagará mais 5 000 euros em despesas com o ensino superior do que em 2023.

Cenário: Despesas/ano com educação superior em 2030, Lisboa

 

Nota: A única variável tida em conta na criação deste cenário foi a inflação sobre os preços atuais (média anual de 2%). Outros fatores e medidas públicas podem influenciar os preços no período de 2023-2024.
* Calculado a 10 meses por ano, descontando os meses de verão.
**Calculado a partir do valor máximo de 871 euros, sem a redução de 20% atualmente em vigor. De notar que a OCDE recomenda que Portugal introduza um sistema de propinas em função dos rendimentos das famílias – se tal sistema entrar em vigor, o cenário será necessariamente diferente.

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