Orçamento à prova de crise

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ão tantas as transações comerciais e financeiras que efetuamos diariamente que há sempre espaço para a poupança. Conheça algumas dicas para blindar o seu orçamento para 2023 e, quem sabe, ainda poupar um pouco para manter o nível de vida a que se habituou e preparar o futuro com uma almofada financeira.

Os piores tempos da pandemia já lá vão, mas os seus efeitos na economia ainda perduram. A guerra na Ucrânia, essa, não parece ter fim à vista. Os problemas energéticos e de circulação de matérias-primas, apesar do alívio nos últimos meses de 2022, ainda não têm resolução definitiva. Os salários sobem pouco ou nada. As taxas de juro dispararam e a subida vai continuar. E a inflação, esse demónio que assusta e intriga tanto os governos como os economistas de todo o mundo, deverá abrandar – mas continuará em máximos de vários anos.

Perante este cenário, é prudente tomarmos medidas para nos defendermos da incerteza. É possível, mesmo entre preços a subir e salários a minguar, garantir um pé-de-meia que nos permita pagar dívidas ou acautelar o próprio futuro e o de familiares. Basta tomar algumas medidas de reforço do orçamento. Umas implicam estar atento e agir, outras exigem alguns (pequenos) sacrifícios, garantem os especialistas ouvidos pela Revista Montepio. A meta é chegar a um orçamento à prova de crise.

Como se começa a poupar?

Um lápis e uma folha de papel (ou de Excel, para quem prefere o mundo digital). Estas são as ferramentas base para o início da poupança. “Para as famílias, o investimento que gera maior poupança é o registo das despesas. Têm de apontar o que gastam. Apenas assim conseguirão saber no que podem cortar”, diz David Almas, analista financeiro e editor do Tlim, um boletim online de finanças pessoais.

Com as despesas e as receitas alinhadas numa folha é mais fácil perceber o que é, de facto, a poupança: é a diferença positiva entre a despesa e o rendimento. E há três formas de conseguir alcançá-la: cortar as despesas, aumentar as receitas ou uma combinação das duas.

“É aritmética: se o custo de vida aumenta, uma família apenas conseguirá manter o seu nível de vida se aumentar os rendimentos ou se reduzir as despesas. É muito mais difícil aumentar substancialmente os rendimentos do que controlar as despesas. Por isso, sugiro que as pessoas se foquem nos maiores encargos familiares, que são normalmente a habitação, a alimentação e os transportes”, elucida David Almas.

Com as rendas a disparar em todo o país, as alternativas passam por tentar negociar com os senhorios ou mesmo ponderar mudar de bairro ou cidade

Poupar na habitação

Um dos maiores encargos das famílias, senão mesmo o maior, é o da habitação. Em 2023, este encargo será sentido na carteira das famílias como nunca. A subida das taxas Euribor está a provocar agravamentos de centenas de euros na mensalidade de quem tem créditos a taxa variável: a três, seis ou 12 meses. Tendo em conta que os empréstimos de taxa variável representam perto de 75% dos créditos à habitação em Portugal, segundo o Banco Central Europeu, são cerca de 1 milhão as famílias que terão de poupar noutros gastos para manter o orçamento mensal no verde.

Quem vive numa casa arrendada também não escapa à tempestade. As rendas estão a disparar em todo o país, em grande parte devido à grande procura por imobiliário, em Portugal, por parte de investidores estrangeiros. Os números são soberanos. As rendas aumentaram 24% em todo o país entre 2010 e 2021, segundo o Eurostat, o gabinete de estatísticas da União Europeia. Em particular nas regiões de Lisboa e Porto, as rendas sofreram aumentos de tal forma que impossibilitam, na prática, que as famílias e cidadãos com um rendimento médio possam arrendar casa na maioria dos bairros das duas maiores cidades do país.

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Crédito à habitação: como escolher o melhor para si

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“Quem tem crédito à habitação deve procurar renegociá-lo periodicamente junto do seu banco ou, caso não tenha sucesso, procurar alternativas na concorrência. Como os empréstimos da casa são normalmente longos, é natural que a redução dos encargos financeiros seja o que tenha mais impacto nos orçamentos das famílias”, sugere David Almas.

Quem arrenda está numa situação mais precária. “Pode haver poder negocial com um senhorio que demonstre algum tipo de flexibilidade. A alternativa é procurar um imóvel que se ajuste ao novo orçamento”, aconselha Bárbara Barroso, especialista em finanças pessoais e fundadora do MoneyLab. Mudar de casa nesta fase do mercado imobiliário, porém, tem riscos associados e pode implicar mudar de bairro ou de cidade. Há, inclusive, cidadãos, sobretudo os mais jovens, que começaram a partilhar casa com amigos ou conhecidos. Dividem-se as despesas, mas também o conforto e o bem-estar.

Poupar na energia

Garantir poupanças num dos elementos que mais rendimento consome no orçamento das famílias, a energia, passa por comparar fornecedores de serviços de eletricidade e gás. As simulações junto dos operadores podem ajudar. E trocar de fornecedor, claro, se encontrar ofertas mais vantajosas. Avaliar se as tarifas, bi-horárias ou não, se ajustam à realidade atual das famílias, muitas delas com elementos em teletrabalho, também pode ajudar a detetar potenciais poupanças.

Reforçar a eficiência energética ajuda a reduzir as despesas. “[Devemos] comprar sempre lâmpadas economizadoras, procurar os eletrodomésticos com maior eficiência ou evitar ter as luzes acesas”, afirma Bárbara Barroso. Como tudo na vida, também na poupança existem mitos. Um artigo do Ei, o blog de literacia financeira do Montepio Associação Mutualista, elenca os dez mitos mais comuns no que diz respeito a poupar em diversas situações. Já conhecia estas dicas?

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Poupar nos serviços bancários

Comissões de contas bancárias inativas ou serviços bancários que já não utiliza podem ser fontes ocultas de despesa. Ao avaliar os extratos bancários poderá aperceber-se de que há poupanças a ser conseguidas. Feche as contas que já não usa e cancele os serviços bancários que considere inúteis, como seguros ou cartões de crédito sem utilização.

Se quer baixar as comissões do seu atual banco, pode optar por mudar de instituição financeira. O Banco de Portugal tem uma lista com os serviços mais comuns sujeitos a estes pagamentos e desenvolveu um simulador onde compara as comissões bancárias cobradas pelos vários bancos.

Poupar na alimentação

Escolher marcas brancas ou usar cartões de desconto nos supermercados pode representar poupanças nada despiciendas, mas o segredo para economizar algum dinheiro na alimentação está mesmo no planeamento, segundo Bárbara Barroso.

“Por exemplo, a elaboração de um menu semanal tendo por base o inventário dos produtos que se tem na despensa”, refere. Por outras palavras: preparar uma marmita com o que já se tem em casa. Ao planear as refeições para a semana e cozinhá-las com antecedência consegue-se “não só uma poupança de tempo como poupança em termos financeiros, com menor desperdício alimentar”, resume.

É quase um lugar-comum da poupança, mas se quer chegar ao final do mês com algum dinheiro na conta corrente deve evitar a tentação dos take-away. Caso não seja possível, reduza ao máximo a encomenda de refeições em restaurantes. Além de ser uma despesa considerável para uma única refeição, ainda terá de pagar uma taxa de entrega.

No supermercado, os produtos mais caros podem ser facilmente substituídos por outros mais baratos e com o mesmo ou maior valor nutricional. “Reduzir a compra de carne, que absorve a maior fatia da despesa dos portugueses no supermercado, segundo as estatísticas mais recentes, pode aligeirar a fatura mensal”, exemplifica David Almas.

Planear as refeições de cada semana e repensar a alimentação, sem prejudicar o valor nutricional, são duas estratégias essenciais para a poupança

Poupar nos transportes

Se vive numa grande cidade, a opção mais óbvia é deixar o carro em casa e optar pela rede de transportes públicos, assinando o passe mensal. Se as deslocações forem relativamente curtas, por que não fazê-las a pé ou de bicicleta?

Se vive em meios mais pequenos, normalmente desprovidos de uma rede frequente de transportes públicos, o carro continua a ser essencial. Mas não desespere. Socorra-se, por exemplo, dos cartões de descontos que, associados às empresas de venda de combustíveis, permitem usufruir de uma redução no custo da gasolina e gasóleo. Os associados Montepio, por exemplo, beneficiam de até 12 cêntimos por litro de combustível simples na Repsol. Para tal, basta mostrarem o Cartão de Associado nas estações de serviço Repsol aderentes.

Outra opção é a partilha de automóvel. “A maioria das pessoas vai sozinha do trabalho para casa e vice-versa”, realça Bárbara Barroso, que explica que esta é uma forma de aligeirar o peso do automóvel no orçamento mensal.

E posso ir de férias?

Se não há dinheiro, não há luxos, já diz o povo. Mas se precisar mesmo de “desligar”, tendo disponibilidade financeira para fazê-lo, é possível conseguir bons negócios na área das viagens e turismo. Ricardo Teles, diretor comercial da agência de viagens Bestravel, diz que a poupança passa pelo “planeamento da viagem, pela compra antecipada e flexibilidade de datas”.

“Planear a viagem para fora das épocas altas ou optar por quartos maiores, onde é possível alojar toda a família, também permite uma poupança muito considerável”, sugere.

A escolha do regime de alimentação também está associada à poupança. No entanto, há que fazer as contas e perceber o que mais compensa. “Dependendo do destino, optar pela meia pensão ou mesmo pelo “tudo incluído” pode sair mais em conta. Há sempre que fazer contas ao que se pagará por cada refeição que não esteja reservada”, recorda. Qualquer que seja o seu destino ou perfil de viajante, saiba que os associados Montepio beneficiam de 5% de desconto sobre os diversos programas de viagens da Bestravel. E o melhor? Para esta poupança não tem de fazer contas.

O que fazer com o dinheiro que poupar?

Esta é a parte fácil. Se, com todas estas dicas, conseguir acabar o mês com algum dinheiro, não faltam sugestões para o aplicar ou, simplesmente, preparar uma almofada financeira para uma eventualidade. Bárbara Barroso acredita que é importante que a família consiga acumular um fundo de maneio que garanta meses de tranquilidade ao agregado no caso de eventuais problemas. De quanto falamos? “Uma quantia de dinheiro que permita ter assegurado entre 6 e 12 meses do custo de vida mensal.” Para as famílias, é este o “grande objetivo” e deverá ser prioritário.

Quando já se conseguiu um pé-de-meia robusto, há várias formas sensatas de aplicar o dinheiro. “Para as famílias que têm créditos, a amortização das dívidas pode ser o melhor investimento, em particular se for acompanhada por uma redução dos prazos dos empréstimos. Além de libertar os orçamentos de encargos regulares, como as prestações, os prémios de seguros e, eventualmente, as comissões bancárias, permite potenciar a taxa de poupança futura porque haverá menos despesas financeiras”, salienta David Almas.

Para pôr o dinheiro a render, David Almas lembra que “os mercados acionistas tendem a render mais no longo prazo, incluindo nos períodos inflacionistas”.

“A inflação tem um efeito negativo nos investimentos porque corrói o poder de compra dos retornos, mas as ações são historicamente os ativos mais resistentes.” O autor e consultor em finanças pessoais adianta que, todavia, nem todos os cidadãos têm perfil para os “altos e baixos de curto prazo da bolsa”. A alternativa de um fundo de investimento “que combine uma exposição aos mercados acionistas e obrigacionistas pode ser a opção mais inteligente”, sugere.

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Por que 2022 foi tão mau?

O ano de 2022 decerto não vai deixar saudades. Em primeiro lugar, pelo regresso da inflação, que esteve ausente das economias desenvolvidas durante décadas. Portugal fechou o ano passado com uma taxa de inflação média de 7,8%, segundo o Instituto Nacional de Estatística (INE). A tendência de aumento dos preços começou em 2021, quando as economias reabriram e a oferta não acompanhou, havendo escassez de bens e serviços. A invasão da Ucrânia pela Rússia veio agravar tudo: dos mercados europeus desapareceram o gás e o petróleo russos. Os cereais ucranianos, até então abundantes, e a produção agrícola proveniente deste país ficaram com as vias de exportação cortadas. Os preços dispararam.

2022 foi ainda o ano que ditou o fim de um longo período de taxas de juro em mínimos históricos. O acelerar da inflação fez com que os grandes bancos centrais tivessem de tomar medidas rapidamente. Para arrefecer as economias e diminuir o consumo, começaram a aumentar as taxas de referência, com vários grandes aumentos em poucos meses. E com estas mexeram as Euribor, que dispararam e agravaram drasticamente a prestação de créditos, como o da habitação de milhares de famílias.

E o que se prevê para 2023?

A incerteza é muita, pelo que as previsões dos economistas chegam com um alto grau de indefinição. As projeções do Banco de Portugal apontam para um crescimento económico ligeiro de 1,5% para Portugal, com o abrandamento da inflação para os 5,8%. Mas choques externos podem alterar este panorama.

As perspetivas para os países da Zona Euro não são assim tão animadoras. O clube da moeda única deverá escapar por uma unha negra a uma recessão em 2023, segundo as previsões da Comissão Europeia, que apontam para um crescimento global de 0,3%. A Alemanha, o “motor” produtivo do Velho Continente, deverá fechar 2023 com uma recessão de 0,6%.

Estes cenários são passíveis de agravamentos se a guerra se prolongar ou se a Europa não conseguir garantir reservas energéticas para enfrentar outro inverno. Nesse caso, por exemplo, a projeção de inflação para 2023 na Zona Euro poderia ultrapassar os 6,1% previstos pela Comissão Europeia.

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