Cacifos Solidários: A chave para apoiar (e retirar) quem vive na rua

O projeto Cacifos Solidários é, em muitos casos, a “chave” que abre a porta para uma nova vida fora da rua. Nestes cacifos está guardada uma palavra: esperança.
Artigo atualizado a 09-01-2019

Os Cacifos Solidários são o único espaço que os sem-abrigo têm como seu e onde podem guardar os seus poucos pertences de forma segura e digna, 24 horas por dia. “Antes tinha um problema de 100 quilos na cabeça e agora é de 40 quilos”, desabafa Carlos, um dos utilizadores dos cacifos amarelos. Nestes compartimentos guardam-se documentos e objetos do quotidiano como roupa, produtos de higiene ou sacos-cama. Mas não só. Existem também lembranças, como fotografias de um outro tempo.

Cacifos Solidários, uma ideia inovadora da ACA

 O projeto Cacifos Solidários, um dos vencedores do Programa FACES 2018, da Fundação Montepio, foi idealizado pela Associação Conversa Amiga (ACA). Em declarações ao Ei, o coordenador da ACA, Duarte Paiva, conta que a ideia de construir estas caixas metálicas amarelas, únicas no mundo, surgiu de uma conversa com um sem-abrigo. “Numa noite, no projeto ‘Um Sem-Abrigo Um Amigo’, também da ACA, um senhor relatava a dificuldade que tinha em proteger e guardar os seus pertences, explicando que arrumava o que lhe era mais importante num cacifo de um supermercado, mas com muitos condicionalismos – requer uma moeda, é muito pequeno e só pode ser utilizado algumas horas por dia.”

Na sequência desta conversa, o coordenador da ACA ouviu mais pessoas e rapidamente percebeu que a falta de um espaço para os sem-abrigo guardarem os seus bens pessoais constituía um entrave à sua integração social. Na cidade de Lisboa existem 350 pessoas sem teto, às quais se somam 51 no concelho de Almada e 46 no concelho de Oeiras, segundo a Estratégia Nacional para a Integração das Pessoas em Situação de Sem-Abrigo.

 Onde estão os cacifos?

 O projeto Cacifos Solidários foi lançado em 2013, com a instalação, a título experimental, de 12 unidades na freguesia de Arroios e, desde então, alargou-se a outros locais de Lisboa. Passados cinco anos, a capital conta com uma rede de 60 cacifos – mas que não chegam para todas as necessidades.

Entretanto, o projeto Cacifos Solidários expandiu-se para a Madeira e França. No Funchal foram colocados 12 cacifos, um número que deve duplicar em 2019. A cidade francesa Montreuil recebeu outros 12 cofres. “Prevemos continuar a fazer crescer o projeto em França e talvez noutras partes da Europa”, adianta Duarte Paiva.

 Mais do que um simples cacifo

O cacifo é entregue por um período de um ano, mas há regras a cumprir. É assinado um contrato em que o sem-abrigo se compromete, por exemplo, a assegurar a limpeza do espaço e a ser acompanhado por uma equipa de profissionais da ACA. A pessoa em situação de sem-abrigo obriga-se a participar em conversas, todas as semanas, que abrem portas para uma maior eficácia da intervenção social. Constrói-se assim um caminho individualizado para a mudança de vida, criando-se uma relação de confiança.

“Além de um local seguro e digno para as pessoas guardarem os seus pertences, o projeto permite, ainda, um acompanhamento profissional de forma mais eficaz e próxima. Existe um ponto de referência físico –  o cacifo – que é a ‘chave’ de uma ligação de proximidade e responsabilidade”, explica Duarte Paiva. A partir deste contexto, é mais fácil responder a algumas necessidades, como tratar de documentação, aceder a alimentos, higiene, rendimento, saúde ou tratamento de dependências.

Os cacifos são também um ponto de “correio” entre os sem-abrigo e as instituições. “Os cacifos possuem uma caixa de correio que permite comunicar com estas pessoas. No fundo, é como ter uma ‘morada’, ainda que estejam numa situação de rua”, remata Duarte Paiva.

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