Relógios adiantam-se uma hora no domingo: saiba tudo sobre a mudança da hora

Os ponteiros estão prestes a adiantar-se 60 minutos. A abolição da mudança de hora foi aprovada pelos eurodeputados em 2019, mas até agora nada aconteceu. Qual é o ponto da situação?
Artigo atualizado a 27-03-2024

A chegada da primavera anuncia a entrada do horário de verão: este domingo, 31 de março, adiantam-se os ponteiros do relógio uma hora. Assim, em Portugal continental e na Região Autónoma da Madeira, à 1h00 passam a ser 2h00; e na Região Autónoma dos Açores, à 00h passa a ser 1h00. Perde-se uma hora de sono, mas dão-se as boas-vindas aos dias de pôr-do-sol tardio. A 27 de outubro, acontece o inverso: a hora volta a mudar, com a entrada do horário de outono, que atrasa os ponteiros do relógio 60 minutos.

É assim que manda a Diretiva 2000/84/CE da União Europeia (UE), em vigor desde 2001, que estabelece a mudança do horário sazonal para todos os Estados-membros no último domingo de março e no primeiro de outubro. No entanto, esta lei nunca foi consensual — e em 2018 esteve mesmo para cair. A Comissão Europeia apresentou uma proposta para abolir a mudança do horário sazonal nos países da UE. Pouco tempo depois, foi aprovada pelos eurodeputados.

 

Mas, até agora, nada aconteceu: os ponteiros do relógio dos países da comunidade europeia continuam a acertar-se duas vezes por ano — e o Conselho da União Europeia nunca deu parecer favorável à proposta, explica o site, mantendo-se em vigor o sistema anterior.  O que aconteceu e em que ponto é que estamos na abolição da mudança da hora?

A abolição da mudança da hora

O mais recente debate sobre a mudança da hora começou em 2018 e quase resultou na abolição do horário bianual na Europa. Tudo começou com a consulta pública online que a Comissão Europeia lançou no verão desse ano e que tinha como objetivo compreender se os europeus concordavam com a mudança da hora.

Dois meses depois, com 4,6 milhões de respostas, 84% dos inquiridos mostraram-se a favor da criação de um horário único. Em Portugal, votaram apenas 0,33% cidadãos — e 79% concordaram em adotar permanentemente o horário de verão. Ainda assim, é importante notar que, apesar de ter sido a consulta pública com maior adesão, apenas 0,85% dos europeus votaram neste inquérito.

No ano seguinte, uma proposta elaborada pela Comissão Europeia para abolir a mudança da hora chegou ao Parlamento Europeu: os eurodeputados votaram a favor, apontando-se 2021 como o ano para a implementação da nova regra. No entanto, sucederam-se acontecimentos globais que atiraram para o fim da lista de prioridades a abolição da mudança da hora — primeiro a pandemia, depois a guerra a Ucrânia e a crise inflacionista que atingiu a Europa. A abolição da mudança da hora está, desde 2019, em suspenso. O Conselho Europeu ainda não definiu a sua posição em relação a este tema, colocando um travão à alteração da lei.

Neste processo, foi pedido um parecer a todos os países. De que lado ficou Portugal? Contra a abolição do horário sazonal. O governo português, através da Comissão Permanente da Hora, órgão do governo responsável pelo cumprimento da hora legal, mostrou-se a favor da manutenção dos dois horários, citando um relatório do Observatório Astronómico de Lisboa (OAL), o então responsável pela gestão da mudança de hora.

Neste relatório, conclui-se que nenhuma das opções sem o horário de verão seria ideal para o país, sendo a permanência deste considerada a menos favorável. A comissão justificou indicando poupança de energia (embora mínima, ainda existe) e efeitos insignificantes no sono.

Prós e contras do horário único

Cada lado da barricada tem os seus argumentos. Por um lado, os que defendem a criação de um horário único alegam que a mudança de hora tem efeito negativo no ciclo circadiano, o nosso relógio interno, o que poderá ter especial impacto em pessoas com perturbações do sono. Criando-se um horário único, a população não seria sujeita duas vezes por ano a este processo de adaptação.

“Acabar com a oscilação entre horários tem aparentemente um impacto positivo na saúde, mesmo que pequeno”, considera Pedro Miranda, professor catedrático de Meteorologia na Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa (FCUL). “Tendo desaparecido a razão principal da introdução da mudança – a economia de energia – porquê manter um sistema de horários oscilantes?”, questiona.

Já o horário bianual, sobretudo nos países de latitude média, permite a maximização do aproveitamento da luz solar e uma poupança da energia — embora já se tenha percebido que esta é muito relativa. É, precisamente, o caso de Portugal. Caso se mantivesse sempre o mesmo horário, haveria desperdício de horas de sol: no verão, este nasceria pelas 5 da manhã; no inverno, pelas 9 da manhã.

“A melhor solução para a hora legal do país é a que atualmente existe. Porém, poderia ser ainda melhor se a transição em outubro (saída da hora de verão) regredisse para finais de setembro, como se fazia até 1995 na Europa”, explica Rui Agostinho, diretor do Observatório Astronómico de Lisboa (OAL).

Além de ser o regime que, de acordo com o astrónomo, melhor se adapta a Portugal, esta tradição traz algumas poupanças energéticas, ainda que essa já não seja a principal prioridade do sistema. “O valor de poupança é, em média, inferior a 1%”, nota Rui Agostinho. Precisamente por acarretar impactos distintos para cada país, Ricardo Cardoso Reis, do grupo de comunicação de ciência do Instituto de Astrofísica e Ciências do Espaço (IA), acredita que, para países a latitudes médias, como o nosso, “há um benefício em manter a mudança”.

Nos países a latitudes mais a norte da Europa é diferente: “Num país como a Finlândia, que no verão tem zonas com 20 horas de sol e no inverno seis horas de luz do dia, a mudança não traz benefícios. E ainda causa o transtorno associado de terem de adaptar-se a uma hora diferente a cada seis meses”, realça Ricardo Cardoso Pires. Face a estas especificidades, o especialista defende que “a mudança de hora não devia ser uma decisão a nível europeu, mas sim a nível nacional”.

Em Portugal, horário de inverno ou de verão?

Adotando-se um horário único em Portugal, qual seria o ideal: o de verão ou o de inverno?  “O menos mau seria manter o nosso horário o mais próximo possível da hora solar, ou seja, manter o horário de inverno. Desta maneira, o amanhecer dos dias de inverno seria por volta das 8h, enquanto no verão teríamos o sol a nascer ainda mais cedo, perto das 5h, e a pôr-se perto das 21h”, argumenta Ricardo Cardoso Pires.

Como começou a mudança da hora?

Não foi de repente e de uma só vez. A mudança da hora remonta a momentos distintos da história. Uma das primeiras propostas para a implementação do horário bianual terá sido apresentada por Benjamin Franklin, um dos pais fundadores dos Estados Unidos, em 1784. De forma a economizar velas durante o verão, Franklin sugeriu que os relógios fossem adiantados durante a época quente, já que assim a população teria acesso a mais luz natural durante a tarde. A alteração da hora começa por ter na sua génese sempre o mesmo motivo: economizar energia através do aproveitamento da luz natural.

O horário bianual, como o conhecemos hoje, surgiu no início do século XX, como esforço para economizar energia durante a Primeira Guerra Mundial. A Alemanha e o Império Austro-Húngaro foram os primeiros países a implementar esta mudança, com o objetivo de poupar carvão.

Adiantar e atrasar os relógios na Europa é, assim, um hábito anterior à existência da UE. A legislação sobre o horário de verão entre os Estados-membros surgiu, pela primeira vez, com uma diretiva de 1980, que coordenava práticas de forma a garantir o bom funcionamento do mercado único. As regras vigentes entraram em vigor em 2001, determinando o dia e hora em que todos os países da UE transitam para o diferente horário, com o objetivo de manter o bom funcionamento de vários setores (como transportes e comunicação) e indústrias.

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