Herança: é possível deserdar um filho?

Pretende que o seu filho não herde quaisquer bens seus? Saiba se a lei permite deserdar um filho e, se sim, em que circunstâncias.
Artigo atualizado a 14-06-2022

Não é fácil deserdar um filho. Ainda que essa vontade seja expressa por testamento. Mesmo por esta via, existem certos herdeiros que, devido ao seu vínculo familiar próximo do testador, são protegidos pela lei, não podendo ser afastados da sucessão. São eles os chamados herdeiros legitimários, que incluem o cônjuge, os descendentes (filhos) e os ascendentes (pais, avós e bisavós).

De acordo com o Código Civil, aqueles herdeiros têm direito a uma porção dos bens da herança, independentemente da vontade do testador. Esta parcela é designada de legítima ou quota indisponível. Desta forma, o testador apenas pode dispor livremente da restante porção dos seus bens, denominada de quota disponível.

A legítima e a quota disponível variam consoante o número de herdeiros legitimários e a sua natureza. Por exemplo, a quota legítima do cônjuge, se não concorrer com descendentes nem ascendentes, equivale a metade da herança. Significa isto que, neste cenário, o testador só pode dispor de metade do seu património para o distribuir como entender. Já no caso de os herdeiros legitimários serem o cônjuge e os filhos, a legítima é de dois terços, sendo a quota disponível de um terço. Não havendo cônjuge, a legitima dos filhos é de metade, se existir apenas um, ou de dois terços, se existirem dois ou mais, correspondendo o restante à quota disponível.

Sabia que…

Os ascendentes só sucedem se não houver cônjuge e filhos?

Deserdar um filho: o que diz a lei

Deserdação

Apesar de, por lei, os herdeiros legitimários terem direito a uma porção dos bens (legítima), existe um mecanismo legal que permite deserdá-los. Isto é, privá-los da sua legítima. Em causa está a chamada deserdação, que tem por base a ideia de incapacidade sucessória, em virtude da prática de atos excecionalmente graves cometidos, direta ou indiretamente, contra o testador.

Segundo a legislação, só se justifica deserdar um filho (ou outro herdeiro legitimário) se ocorrerem as seguintes circunstâncias:

  • Ter sido condenado por algum crime doloso, isto é, intencional, não meramente negligente, mesmo que não consumado, cometido contra a pessoa, bens ou honra do autor da sucessão ou de um seu cônjuge, ascendente, descendente, adotante ou adotado, desde que ao crime corresponda uma pena superior a seis meses de prisão;
  • Ter sido condenado por denúncia caluniosa ou falso testemunho contra as mesmas pessoas;
  • Ter, sem justa causa, recusado ao autor da sucessão ou ao seu cônjuge os devidos alimentos.

O que fazer?

A vontade de deserdar um filho tem de ser declarada em testamento, com indicação do motivo da deserdação. No entanto, o deserdado pode impugnar a deserdação em tribunal, alegando a inexistência da causa invocada pelo testador. O prazo para fazê-lo é de dois anos a contar da abertura do testamento.

Indignidade

Há ainda outra forma de deserdar um filho, nomeadamente recorrendo ao mecanismo da indignidade.

À luz do Código Civil, são os seguintes os atos que tornam um filho indigno de receber uma herança:

  • Ter sido condenado como autor ou cúmplice de homicídio doloso, mesmo que não consumado, contra o autor da sucessão ou contra o seu cônjuge, descendente, ascendente, adotante ou adotado;
  • Ter sido condenado por denúncia caluniosa ou falso testemunho contra as mesmas pessoas, relativamente a crime a que corresponda pena de prisão superior a dois anos, qualquer que seja a sua natureza;
  • Ter, por meio de dolo ou coação, induzido o autor da sucessão a fazer, revogar ou modificar o testamento, ou disso o impediu;
  • Ter dolosamente subtraído, ocultado, inutilizado, falsificado ou suprimido o testamento, antes ou depois da morte do autor da sucessão, ou aproveitado de algum desses factos.

Tome nota

A indignidade pode ser invocada para deserdar quaisquer herdeiros.

O que fazer?

A indignidade pode ser executada automaticamente, se os bens não estiverem no poder do indigno. Para isso, basta não entregar os bens. Caso o indigno já se encontre na posse dos bens, a indignidade tem de ser judicialmente decretada.

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